Acidentes Ofídicos
Em Medicina Veterinária, os acidentes ofídicos mais freqüentes envolvem as serpentes dos gêneros Bothrops (jararaca, urutu, caissaca, jararaca pintada, jararacussu, jararaca ilhoa) e Crotalus (cascavel, boicininga e maracambóia). Acidentes com Micrurus (coral verdadeira) e Lachesis (surucucu pico de jaca, surucutinga) são raros, não havendo soro específico de uso veterinário para o tratamento dos acidentes para essas duas últimas espécies. Maiores informações devem ser obtidas em Emergências Médicas. Para uso veterinário, no Brasil existe somente o soro antiofidíco que neutraliza tanto o veneno crotálico como o botrópico.
A predominância dos acidentes com animais envolve as serpentes do gênero Bothrops, sendo entretanto o acidente crotálico que apresenta maior risco de vida para o animal. É importante que o clínico esteja preparado para realizar a identificação da serpente não somente pela observação das características da mesma, mas pela evolução dos sintomas.
As serpentes peçonhentas apresentam como características comuns (exceção feita para coral) a presença de fosseta loreal e pupila em fenda vertical. O gênero Crotalus apresenta guizo na cauda. O gênero Bothrops apresenta cauda lisa, sem qualquer estrutura , com manchas pelo corpo em forma de ferradura.
Acidentes com serpentes não peçonhentas, como as jibóias, sucuris, boipevas, caninanas, salamantas, cobras-verde, e falsas corais ocorrem, mas são de pouca importância dependendo do porte do animal, devendo ser encarado como um ferida contaminada que deve ser tratada com antissépticos.
Acidente Botrópico
O sintoma mais evidente é o edema progressivo (inchaço) no local da picada, como no focinho, barbela ou membros podendo em muitos casos ser observado também hemorragia, não sendo esta necessariamente a causa da morte.
É importante ser considerada para efeito de atendimento e tratamento, o local da picada e a espécie animal acidentada. Nos animais de grande porte, a picada nos membros leva à dificuldade de locomoção e muitas vezes ao decúbito prolongado, incapacitando o animal para pastar e ter acesso aos bebedouros. O acidente na região da boca e língua pode impossibilitar o animal de ingerir alimentos e água o que propicia a desidratação.
Nos eqüinos dada a incapacidade desses animais respirarem pela boca, a picada no focinho pode levar a morte por insuficiência respiratória. O mesmo pode ocorrer com bovinos quando o edema atinge a região da laringe.
A gravidade do acidente botrópico está relacionada à quantidade de veneno injetada no momento da picada e o tamanho do animal. Quanto menor o porte do animal, menor a chance de sobrevivência. Quanto maior for o intervalo entre o acidente e o tratamento, mais graves serão os sintomas e as seqüelas observadas, principalmente necroses.
Tratamento:
Em Medicina Veterinária, o tratamento é feito a partir das quantidades de veneno que as serpentes podem injetar no momento da picada. Nos acidentes causados por serpentes do gênero Bothrops a quantidade de soro a ser utilizada deve ser suficiente para neutralizar no mínimo 100 mg de veneno e 50 mg no caso de acidentes com serpentes do gênero Crotalus. O soro antiofídico de uso comercial é padronizado de forma que 1 mililitro neutraliza 2 miligramas de veneno botrópico e 1 miligrama de veneno crotálico. Assim sendo, a quantidade mínima de soro antiofídico a ser aplicada nos acidentes crotálico ou botrópico é de 50 mililitros independente do tamanho do animal.
Em animais de grande porte (acima de 50 Kg) o volume total de soro (50 mL) deve ser aplicado lentamente por via intravenosa. Nos animais de porte menor, o soro deve ser diluído em solução fisiológica e aplicado gota a gota por via intravenosa. Na impossibilidade de se utilizar a via intravenosa, o soro deve ser administrado preferencialmente pela via intraperitoneal ou em último recurso pelas vias intramuscular e subcutânea. Em hipótese alguma o soro deve ser aplicado ou infiltrado no local da picada. Doses maiores de soro e a necessidade de repetição do tratamento devem ser consideradas em função da remissão dos sintomas ou a critério do Médico Veterinário.
A quantidade de soro a ser utilizada deve ser aplicada independente do tempo decorrido entre o acidente e o atendimento, sendo que a eficácia do tratamento com o soro é maior quanto menor for esse tempo.
Tratamentos Complementares:
Os animais acidentados devem ser mantidos sob observação permanente de no mínimo 72 horas, devendo ser mantidos em locais sossegados, confortáveis e submetidos ao mínimo de movimentação ou manipulação.
Os animais com incapacitação para ingerir água devem ser adequadamente hidratados por via parenteral com soluções eletrolíticas como ringer lactato.
Nos animais acidentados na região da cabeça, particularmente equídeos, a dificuldade respiratória deve ser corrigida mediante a realização de traqueostomia. Os animais de grande porte (acima de 100 Kg), principalmente quando acidentados nos membros, devem ser mantidos quando em decúbito em local forrado com bastante capim ou areia macia.
Os ferimentos no local da picada devem ser lavados com água e sabão e tratados com antissépticos. O local da picada não deve ser lancetado, perfurado ou garroteado com o intuito de reduzir a absorção do veneno. Essa prática pode levar a infecções gravíssimas, e contaminação pelos microorganismos causadores do tétano ou gangrena gasosa. O uso de antibióticos e a profilaxia do tétano devem ser feitas sob orientação do Médico Veterinário.
Sintomas de reações anafiláticas causadas pela aplicação do soro são raros e devem ser tratados de acordo com a gravidade, com medicamentos a base de adrenalina, antihistamínicos e corticosteróides, e interrupção temporária da administração do soro.
Em alguns casos de animais mesmo tratados adequadamente, pode advir o óbito em virtude da presença no veneno inoculado de grande quantidade da fração hemorrágica que causa lesão disseminada do endotélio vascular causando hemorragias fatais na face, nas cavidades abdominal, torácica ou ainda no saco pericárdico ou no espaço subdural, razão pela qual a necrópsia deve ser sempre realizada nesses casos. Essa fração hemorrágica nem sempre é neutralizada pelo soro utilizado no tratamento.
Acidente Crotálico
O acidente crotálico se caracteriza por ausência de alterações no local da picada a não ser o ferimento causado pelas presas da serpente, nem sempre visível . Os sintomas mais evidentes nesse tipo de acidente são a urina de coloração escura (mioglobinúria), sinais de cegueira, dificuldade na locomoção, imobilidade total e decúbito.
Nos cães, observa-se além da imobilidade, dificuldade do animal em sustentar o peso da cabeça, paralisia do globo ocular e diminuição ou
ausência dos movimentos da palpebra. O olho do animal parece estar "vidrado". Nos bovinos e equinos a paralisia do globo ocular pode ser observada pela rotação da cabeça do animal, sem a contrapartida da rotação do globo ocular em sentido contrário.
Os cães apresentam, à medida que os sintomas evoluem, prostração total e dificuldade ou ausência de qualquer manifestação de resposta
quando estimulados pelo dono.
A morte do animal não tratado se dá pela paralisia respiratória e ou insuficiência renal aguda.
Tratamento:
As serpentes do gênero Crotalus tem capacidade de inocular no ato da picada em média 50 miligramas de veneno, quantidade que pode ser maior em função do tamanho da serpente ou do tempo de jejum que se encontra a mesma..
O tratamento desse tipo de acidente como já foi anteriormente mencionado deve ser feito com o soro antiofídico, utilizando o volume mínimo (50 mL) suficiente para neutralizar 50 miligramas do veneno. A aplicação do soro segue as mesmas recomendações descritas no caso do acidente botrópico, ou seja a via preferencial é a via intravenosa. No caso de reaparecimento dos sintomas (urina de coloração escura) o tratamento deve ser repetido.
Tratamentos Complementares:
No acidente crotálico é imprescindível o confinamento do animal de grande porte e a internação em ambiente hospitalar dos de pequeno porte. A aplicação de líquidos e eletrólitos deve ser feita de forma agressiva por via intravenosa de modo a ser mantida a perfusão renal. A coloração e o volume de urina emitida pelo animal deve ser constantemente observada, bem como a realização de testes de avaliação da função renal com finalidade de se prevenir o desenvolvimento de insuficiência renal aguda pela presença da mioglobina na urina e da ação do próprio veneno.
Nos cães e mesmo em animais de grande porte, além dos cuidados de enfermagem, deve ser administrado periodicamente colírios a base de solução fisiológica para se evitar o ressecamento da córnea e o aparecimento de úlceras.
Os sintomas de prostração, imobilidade e dificuldade de locomoção persistem por vários dias mesmo no animal tratado, em virtude das lesões ocorridas nas fibras musculares. Durante todo o tempo de internação, deve ser oferecido ao animal água em pequenos volumes diretamente na boca de forma a não deixar haver ressecamento das mucosas e no segundo ou terceiro dia de tratamento deve-se oferecer alimentos de consistência pastosa diretamente na boca do animal, mesmo quando se encontram em decúbito lateral.
A recuperação plena do animal acidentado mesmo tratado pode levar semanas, não devendo em hipótese alguma os animais serem forçados a se movimentar além do necessário. Nos casos de animais de grande porte como os bovinos e equinos, o tratamento com soro deve ser feito no local onde se encontrou o animal, evitando-se ao máximo o esforço de movimentação, particularmente nas primeiras horas pós tratamento.
Considerando que a picada da serpente pode inocular microorganismos patogênicos, a profilaxia do tétano e o uso de antibióticos siatêmicos de ser considerada, ficando o seu uso a critério do Médico Veterinário.
Soros Disponíveis no Mercado
Nome Comercial do Soro: Soro Antiofídico - Vencofarma
Formulação: Botrópico - Crotálico
Apresentação: Caixas com 5 ampolas de 10 ml
Capacidade de Neutralização: Cada mililitro neutraliza 2,0 mg de veneno de B. jararaca e 1,0 mg de veneno de Crotalus durissus terrificus
Endereço Completo: Travessa Dalva de Oliveira, 235; Chácara 5 - Gleba Lindóia; 86360-380 - Londrina - Paraná - Brasil.
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